sábado, 1 de janeiro de 2011

Capitulo quinze: Palavras.

- Como? - Parei atônita.

- Lia Pellegrini foi a vampira que me transformou. De quem eu bebi sangue antes de morrer na vida humana. – Ele repetiu.

- Como foi isso?

- Longa história.

- Nós temos tempo. – Agarrei o seu braço antes que ele se afasta completamente de mim, no entanto agora, eu encarava suas costas.

E tudo o que nos cercava era o silêncio.

- Por favor. – Comecei com a voz fraca. – Por favor, confie em mim. Conte.

- 1873. – Ele suspirou. - Foi na Itália em 1873. – Ele virou o rosto para mim de novo e segurou minhas mãos com uma expressão... De angustia?

- Você tem... 137 anos? - Perguntei perplexa.

- Se contar os anos humanos, 157. – Ele deu de ombros. – Tem certeza de que quer discutir isso no meio do corredor?

- Onde você a conheceu? A Lia? – Perguntei sentindo algo estranho esmagar meu peito.

-Em Roma. Eu nunca havia saído de lá, nasci em Roma.

- Roma? Quando você dizia Roma eu sempre pensava num lugar menor – Tentei sorrir. Mas ele continuava tão sério e distante nas memórias que logo minha tentativa foi por água abaixo.

- Eram outros tempos. Tempos religiosos e bem incômodos se quer saber. Havia padrões para tudo, regras para tudo. Quando Lia apareceu, ela era algo inimaginável, sabe ela quebrava esses padrões numa época em que ninguém tinha coragem para fazer isso.

- Você se apaixonou por ela? - Perguntei sentindo algo estranho contra meu peito.

Ele puxou minha mão e começamos a andar.

- Pensei que sim. – Ben admitiu por fim, em tom de voz que eu reconhecia bem, amargura. – E por mais irônico que lhe pareça, eu era um homem religioso, do tipo que vem de uma família tradicional. Minha vida já havia sido toda decidida por meus entes antes mesmo de eu nascer. Era assim que tudo acontecia, mas eu não queria isso. – Eu ouvia seu tom de voz baixar a cada palavra, se tornando mais arrastado, mais triste. – As pessoas, costumavam ter uma idéia muito simples e romântica de como era a vida. E pensei que Amélia era a minha saída do mundo dos padrões e ela se tornou tudo o que eu queria... Até que eu a conheci de verdade.

- Então, o que? Quer dizer que ela transformou você por amor? – Ele riu, mas sem humor nenhum.

- Acredito que Lia só tenha bons sentimentos para com o irmão e só ame a si mesma. Mas ela gosta de jogos.

- Como você pode ter tanta certeza? – Senti aquela estranha sensação esmagar meu peito mais uma vez. – De que ela não ama você?

- Eu a conheço.

- Passou muito tempo com ela?

- Muitas perguntas... Foi a muito tempo, não importa mais. – Ele queria finalizar o assunto.

Mas é claro que não.

- Claro que importa! – Resmunguei sentindo a adrenalina da raiva me invadindo - Lia Pellegrini a herdeira do representante vampirico, loira, linda e sua.... Sua ex!

- Ciúme, amore mio? – Ele ergueu as sobrancelhas.

- Não... – Retruquei. – É só que ela aparece do nada e te chama de querido e...

- Ela não apareceu do nada. – Ele me interrompeu. – Pietro foi mandado a algum trabalho. E eles são bem ligados desde que eram irmãos humanos.

Certo, um pequeno flash me trouxe a lembrança da conversa “Os representantes precisarão vir...” Mas isso não me importava muito agora.

- Não a defenda! – Resmunguei.

- Não estou defendendo, estou constatando um fato.

- Então termine sua história.

- Acho que já tivemos o suficiente sobre isso.

- Não é justo, você nunca diz nada do que eu quero. – Falei com uma voz esganiçada e estridente. Não que fosse minha intenção.

E ele só ficou me olhando, com as sobrancelhas erguidas e eu comecei a me sentir como uma criança birrenta. Mas ei! É isso mesmo que eu sou. Não posso evitar.

- Não faça essa cara. – Meu tom de voz voltou ao normal.

E pra melhorar ainda mais meu humor com relação a ele, adivinhe só, ele começou a dar risada. Que romântico.

- Um dia, amore mio. Mas não hoje.

Respirei fundo, sabendo que o “um dia” na verdade seria nunca.

***

As gêmeas criaram um bom habito de se manterem, na maior parte do tempo, nos dormitórios de suas colegas de sala. (Cujo quais não em importei em gravar os nomes). Bom, não que não gostasse das gêmeas, mas ficar sozinha tem sido algo realmente complicado desde que vim para cá. Então, fiquei bem feliz por não ter ninguém no quarto quando entrei.

Segui direto para o colchão e enfiei meu braço de baixo dele, tateando.

A capa vinho com os dizeres em dourado continuava a mesma, por alguns minutos só fiquei ali, olhando, como se eu estivesse no Louvre vendo a Monalisa.

Até que eu abri, e caramba, as folhas já estavam até meio amareladas e a tinta das letras meio borradas. Ele escreveu isso aqui com o que? Penas? Qual é vovó!

Mas mesmo assim eu perdi mais alguns minutos só admirando os rabiscos, haviam palavras e até desenhos nas laterais.

Uns desenhos que nem eu entendi... Pareciam símbolos, letras de cabeça para baixo.

Concentrei-me nas palavras.


30 de novembro de 1999.

Estou na escola, tentando distrair-me dos papeis. A rotina das aulas tem se arrastado por aqui, claro que amo minha profissão, mas sinto mais conforto junta a minha filha e minha neta. Andy diz é a idade, que eu estou me tornando uma avó coruja.

Acontece que isso eu sou desde que a próprio Andy nasceu, uma corujona de família.

Muito bem, hora de respirar fundo e voltar aos papéis. Tenho de dizer que a prova do Frederico Oliveira me fez acreditar que faço meu trabalho direito, mas a do Carlos quase me fez querer colar meus próprios lábios com magia. Porque sempre há algum aluno que simplesmente não se interessa em aprender?

Bom, bom. Os papéis me esperam.


Eu fiquei ali... Olhando as palavras.

Não sei o que esperava... Porque vovó queria tanto que eu ficasse com isso? Quero dizer, o que havia ali de tão importante?

Mas esses pensamentos tão simples dela fizeram meus olhos arderem.

Eu sentia saudades.

Quando eu ia superar?

Acho que talvez nunca.

Suspirei e voltei a olhar os desenhos que se embaralhavam nas pontas do papel.

- Eu nunca vou perdoar você, Gabs! – Levei um susto quando vi Cherrie e Brige entrando no quarto.

E cheia de livros.

- E você me deve uma pelo resto da sua vida, entendeu? – Cherrie rolou os olhos e eu ri.

- Duas traidoras vocês são! Olha só, as panteras são três. Vocês não podem me deixar sozinha. – Brige reclamou.

- Tudo bem, nós temos dever de casa suficiente para nos desculpar. – Cherrie deixou os livros caírem na minha cama.

- Não encontraram nada? – Perguntei.

- Nada útil. Mas acho que não vou ter problemas com estudo pelo resto da minha vida, porque vou te contar nunca li tanta coisa de uma vez só! – Cherrie reclamou de novo, se sentando perto dos livros.
Fechei o diário e o coloquei na gaveta na escrivaninha que sustentava o abajur.

- De nada por isso! –Brige mostrou a língua.

E nós três começamos a ler de novo.

Vi guias de criaturas sobrenaturais, livros sobre os sete pecados, e até uma bíblia Brige estava lendo.

Mas de realmente concreto relacionado a filhos do pecado.

Só paramos quando as gêmeas voltaram para o quarto, porque Brige ainda julgava isso uma “missão secreta”

Não que ela fosse cair em silêncio sobre isso por muito tempo, mesmo que o almoço do dia seguinte ganhasse atenções diferentes...

- Vocês viram as “visitas”? – Brige fez aspas no ar, quanto se sentava junto a mim e Cherrie.

- Difícil não ver. – Cherrie resmungou. – Parece que eles foram mais rápidos do que prevíamos.

Observamos as figuras que nos observavam. Não especificamente nós, mas todos os alunos. Claro, esses que obviamente reconheciam essas pessoas, já que estudávamos sobre elas também.

Uma fada sorridente (como todas as fadas, dã) de cabelos grisalhos e curtos, repicados em todas as direções, com asas grandes e brilhosas e olhos em rosa – choque, era Celeste Beumonte. Ao lado, um bruxo de olhos e cabelos tão negros quanto a enorme ônix que trazia no anel em seus dedos, Alexandre Sato junto a Felícia Diaz, alta ruiva e com um colar de Alexandrite.

E mais afastado, Pietro Pellegrini.

- Os representantes precisarão vir... – Repeti baixinho. – Chegaram.

- Mas tantos assim... – Ouvi Cherrie.

Suspirei... Mas minha atenção foi desviada a um novo alguém que entrava no refeitório, com o uniforme do instituto.

- Não. Pode. Ser. – Falei pausadamente olhando Amélia Pellegrini.

- O que? – Cherrie e Brige perguntaram.

- Lia Pllegrini, vai estudar aqui?! –Arregalei meus olhos, incrível, varias pessoas já começavam a formar um círculo de conversas ao redor dela.

- Lia, irmã de Pietro? Nem sabia que ela era envolvida com política. – Cherrie resmungou.

- Não se envolve. – Reclamei.

- Calma Gabs, até que Lia parece ser legal. – Brige sorriu.

- Ela é ex do Bem. – Reclamei de novo.

- Ela é uma vadia. - Brige reformulou e me fez rir.

Bom, você sabe. Acho que esse é o talento de Brige.

- Olha, vamos esquecer Lia Pellegrini e nos concentrar na nossa missão. – A ruiva ficou séria.

- Qual o novo plano? – Indaguei.

- Não tenho a mínima ideia... Nem o Google m deu uma resposta útil. – Brige revirou os olhos.

- Sobre isso... Eu acho que sei o que podemos fazer. – Cherrie interrompeu.

- Diga!

- Olha, eu nem sei se vai dar certo. Na verdade acho que não vai ajudar me nada, mas como estamos dando voltas e voltas sem saber...

- Cherrie, desembucha! – Brige quase gritou, e depois tampou a própria boca e fez uma careta engraçada. – Fale! - Ela completou.

- Eu estive pensando. Uma de nossas “pistas” é a minha visão. – Ela desenhou as aspas no ar, como Brige havia feito antes - Então, olha. Eu já disse que provavelmente vai dar errado, mas eu pensei que talvez...

- Cherrie, fale! – Dessa vez fui eu quem pediu.

-Eu acho que podemos tentar invocar o espírito do morto que falou comigo.