terça-feira, 26 de outubro de 2010

Capitulo nove: Impressionada.

A noite foi tranquila, até demais. O que resultou em um atraso para mim. Não havia sinal de Cherrie ou gêmeas, ou qualquer coisa capaz de andar, rastejar, voar, ou que seja, quando acordei. Grandes amigas!

Concentrei-me em me arrumar o mais rápido possível, e então, correr. Quase me atirei pela porta... Qual era a primeira aula mesmo? Eu devia decorar meu horário logo...

E caramba! Eu devia estar mais atrasada do que imaginei, os corredores estavam completamente desertos. Nenhum sinal de qualquer criatura viva, ótimo! Ou ao menos, alguma criatura visível.

Meus ouvidos detectaram passos, rápidos e altos. Há mais alguém atrasado, afinal.

Eu os segui, mais por extinto do que necessidade. Logo eu encontrei um corpo magro de longos cabelos, que eu reconheceria em qualquer lugar.

- Cherrie! – Chamei e ela se virou apenas de perfil. – Espere! HA! Bom dia para você também, ein! – Exclamei irônica.

O que deve ter sido um erro porque ela saiu correndo. Graciosamente, mas ainda assim, correndo.

- Cherrie! Cherrie espere! – Gritei e sai disparada atrás dela.

Pensei que seria mais fácil, mas caramba, a garota sabia correr!

Não que eu fosse desistir também. Já que minha quase-única amiga estava, aparentemente, desesperada. Será que Brige estava na aula? Ela deve ter conselhos bem melhores que os meus, seja lá para que seja.

Eu gritei seu nome mais uma vez enquanto ela corria, sem sequer olhar pra trás, na direção da saída da escola. Por um momento, enquanto passava pelos grandes portões, pensei tê-la perdido do meu campo de visão, mas depois de alguns passos lá estava o pequeno corpo todo encolhido no ultimo degrau da escadaria. De cabeça baixa, agarrada as próprias pernas.

- Cherrie, você está bem? – Perguntei descendo as escadas, olhando para suas costas.

Silêncio.

- O que aconteceu? E Brige, onde está?

- shhhhh. – Ela fez um chiado triste como se me mandasse ficar quieta. – Perguntas, perguntas, perguntas...

- Cherrie... – Comecei duvidosa me aproximando até estar apenas um degrau acima dela. – O que aconteceu? – Completei pausadamente.

- Shhh! Não é uma boa garota, não é. Detestável, sim. Isso, detestável...

- Ah deus, você precisa ir a enfermaria? Eu não entendo o que você quer dizer...

Ela começou a gritar. Gritar como uma louca.

- Cherrie, Cherrie o que está acontecen... – Entrei em desespero, cambaleando até me manter na frente dela e tentei colocar minhas mãos em seus ombros mas ela revidou e se jogou para o chão. Eu a contornei procurando olhar para o seu rosto que ela mantinha abaixado. Santa Glinda do norte, ela gritava como se alguém a estivesse matando.

- Cherrie, Cherrie!

- Detestável... Detestável... Não há como fugir, há... Não há, você não vai....

- O que... - Eu ia repetir a pergunta, mas a coisa ergueu o rosto para mim. A coisa porque aquilo não era Cherrie. O corpo podia ser igual, mas não era. Os seus olhos estavam totalmente brancos e pior duas lagrimas escorriam, uma em cada olho. Lágrimas vermelhas, lágrimas de sangue.

- O que você fez com Cherrie... – Gaguejei procurando alguma voz que ainda me restasse. A coisa estava de pé agora, na minha frente.

- Não é uma boa garota, Gabriela, não é uma boa garota...

- Onde está Cherrie? – Eu perguntei, agora lutando para me recompor. Encarando de pé a coisa.

Mais lágrimas escorriam dos olhos brancos, manchando de sangue o pescoço, as roupas...

E a coisa sorriu.

- Tão tola, tão tola Gabriela... A morte está atrás de você, a morte vai pegar você... – Aquilo cantarolava.

- O que é você? O que fez com Cherrie?

- Encontrará, há. Encontrará! No inferno!

Ela me empurrou, mas eu não senti o gramado que esperava. Eu cai em algo mais.. Macio e limpo, como estofamento.

Que diabos está acontecendo?

Tudo era escuridão, escuro feito breu. Eu estava sozinha com o meu medo.

Tateei tentando encontrar algo, era sólido, apertado, abafado... E tinha a forma de um... De um caixão.

Então eu estava em desespero. Gritando. Berrando. Urrando.

A sensação claustrofóbica inundou meu peito.

No meio dos meus gritos eu podia ouvir pequenos ruídos abafados, um tilintar contra a tampa.

Eu estava sendo enterrada... Enterrada viva.

- Gabriela! - Ouvi distante.

Eu só fechei meus olhos, o mais forte que podia tentando conter o medo, tentando conter as lagrimas. Era impossível.

Então eu só continuei gritando feito louca mesmo.

- Não... Não... Eu estou viva, viva!

- Gabriela! Acorde! – Senti meu corpo tremer.

- Ah, ah... – Suspirei ofegante... – Não! Há, o que...

- Calma garota, está tudo bem.

Eu abri meus olhos e me deparei com Cherrie, a verdadeira Cherrie com olhos de íris negras.

- Cherrie! Oh, é você mesma? – Perguntei segurando seu braço. Nada de lagrimas de sangue, nada de gritos, nada de correria. Apenas Cherrie.

- Quem você esperava? Madonna? – Ela deu um sorrisinho.

– Mas, você está bem?

- Claro que sim, você é que não deve estar.

- Começou a gritar enquanto dormia. Assustou a todas nós. – Só então eu percebi Anastácia olhando para mim atrás de Cherrie, ao lado de Abgail.

- Desculpem. – Murmurei. – Um pesadelo, foi só um pesadelo. – Só ai me dei conta. E eu nunca havia me sentido tão aliviada em toda minha vida.

Deixei minha cabeça tombar no travesseiro enquanto um coração voltava ao ritmo normal.

Nada havia sido real. Nada.

- Se tudo está bem eu vou voltar para a cama. – Anastácia resmungou.

- Claro, claro... Desculpe. – Murmurei.

- Você está bem mesmo? – Cherrie murmurou para mim.

- Sim, agora eu estou. Só... Bem, posso deixar o abajur aceso? – Perguntei movendo meus olhos para a escrivaninha ao lado da minha cama.

- Claro! – Cherrie riu. – Tente dormir de novo. Ainda temos tempo até a aula.

- Sim, sim. – Resmunguei. – Mas Cherrie, e as suas visõ...

- Boa noite. – Cherrie sorriu me cortando e voltou para sua cama. – Tudo vai ficar bem, agora.

Eu me revirei por alguns minutos, mas depois fitando a luz do abajur, adormeci novamente.

Um pesadelo, só isso. Tudo estava bem.

Então porque eu não conseguia tirar a palavra morte da cabeça?

***

- Então, você acha que eu te enterraria viva? – Cherrie me encarou.

- Não era você. – Dei de ombros. – E foi só um sonho.

- Só o mais horrendo pesadelo, você quis dizer. – Brige interrompeu.

Nós quase sussurrávamos em nossa mesa de almoço. Era dia, dia de verdade dessa vez.

- Gabriela... Eu queria te pedir um favor. – Cherrie começou. – A vocês duas, na verdade.

- Diga.

- Sobre as minhas visões... – Ela suspirou – Eu quero manter sob o máximo de segredo possível.

- Ah, claro. – Me lembrei de quando ela me interrompeu na noite passada, quando tocaria no assunto na frente das gêmeas Osírio.

- Minha boca é um túmulo, só que cheiroso claro. Sem querer te fazer lembrar nada, Gabs.

Eu ri para Brige.

E depois me lembrei das perguntas.

-Cherrie, sobre suas, você sabe... – Diminui o tom de voz.

- Sim, eu também estou assustada. – Ela entendeu antes que eu terminasse. – Não é legal não saber as coisas que você mesmo diz.

Bom, eu sei que Cherrie era quem deveria ter mesmo medo disso, mas se você visse alguém chamar seu nome, dizer morte e desmaiar, também ficaria um pouco impressionado não acha?

- Miguel disse que pode ajudar você a se lembrar... – Brige começou.

- Sim, mas melhor do que me lembrar, ele disse que eu posso me concentrar e saber o que o espírito queria dizer. Porque só as palavras não fazem sentido, vocês as ouviram. “Lutar, Gabriela, Morte” – Ela parou pensativa. – Eu vou vê-lo, depois das aulas.

- E depois de tanta coisa, vocês ainda se lembram da professora Lory mentindo sobre as férias da professora Melany. – Lembrei.

- Oh. Vocês não podem escolher um assunto mais feliz, por favor. O fim de semana está chegando... – Brige começou.

- Sim! – Cherrie sorriu. – Quais os planos?

-Vou para Londres. Mamãe diz que preparou um piquenique para a família toda. – Brige sorriu.

- Vou ver minha mãe. – Fiquei feliz por me lembrar disso. Tínhamos permissão para sair do instituto aos sábados e domingos.

- Vocês têm mesmo dezessete anos? - Cherrie riu.

- Quais seus planos? - Perguntei enfiando uma garfada de torta na boca, quase tinha me esquecido do almoço na minha frente.

- Eu e Lucy vamos ficar na escola. Papai e mamãe resolveram viajar para a Rússia, ou sei lá onde.

- Você vai passar o fim de semana na escola e nós que somos as adolescentes anormais! – Brige riu.

- Touché. – Cherrie ergueu a taça com uma pequena referência.

- Acho que nós devemos nos voltar para o agora e nos concentrar que termos aula de Técnica em duelo, com o professor Giatti.

- Alguém no mundo chama Marek de professor Giatti? – Cherrie riu. – Você pode variar para professor lunático se quiser, mas Giatti!

- Não gosto dele. Ele fala demais. – Resmunguei, me levantando.

- Ele é o melhor professor do instituto. – Cherrie retrucou.

- Nem tente reclamar. Você não tem aula de anatomia mutável. Ainda mais com a professora Dóris Oliveira, em bons termos ela é descrita como diabólica, perversa, maligna, louca... e mais uma porção de adjetivos, mas depois desses eu só me lembro dos mais grosseiros.

- Boa sorte para você, Brige. – Sorri quando nos separávamos para torres diferentes.

- Eu vou precisar!

Eu e Cherrie fomos para a sala e Marek Giatti não demorou.

- Boa tarde bruxinhas e bruxinhos! – Ele riu saltados dois degraus da escada de cada vez. Jogou uma mochila preta na sua mesa quando chegou perto o suficiente para isso. – Eu sou Marek Giatti, e eu sei que vocês já sabem disso, mas técnica em duelo é a minha verdadeira aula e essa sala é o meu reino. – Ele se se sentou na mesa, é, na mesa. – Eu vou chamar todos vocês pelo primeiro nome, portando, eu sou Marek. Nada de senhor, professor ou tio Giatti! E bem, técnica em duelo não quer dizer que você só irão transformar uns aos outros em sapos ou baratas, eu quero ensiná-los a se defender e a atacar um adversário, em caso de NE-CES-SI-DA-DE nada de incentivo a encrencas aqui crianças, e pode ser útil se alguém for um esportista interessado na olimpíadas bruxas, ou sei lá... O fato é que, um bom bruxo precisa saber duelar, isso inclui ataque e, principalmente, defesa. – Ele parou. – Alguma pergunta?

Silêncio.

- Ótimo. – Ele abriu a mochila um estojo e onde tirou um hidrocor preto, que logo começou a girar freneticamente no ar.

- Minha primeira vítima... – Ele arqueou uma sobrancelha. – Você – Apontou para um garoto. Seu nome?

- James Conrad.

- James! Feitiços defensivos. Pense rápido. - O hidrocor que girava se lançou no menino, que quase gritou “protiegun” fazendo o mesmo parar a milímetros dele, suspenso no ar.

- Ótimo! – Marek sorriu. – Mande de volta.

O hidrocor voltou para a direção do professor e parou flutuando, novamente.

- E... A garota loira da primeira fila. – A mesma coisa, caneta arremessada no ar. Parando de frente ao rosto.

- Se nome?

- Mirian Ferreiro. – O hidrocor voltou.

- Nem precisou dizer as palavras em voz alta. Ótima Mirian!

Depois de uns dez nomes, Marek mudou para três canetas de uma vez, na verdade isso foi justamente quando ele mandou as canetas voando para mim.

Ta, sem mania de perseguição.

- Gabriela Alcântara.

- Demetria Forhollow.

- Marília Gonzalez.

- Diego Montrevan.

- Camillus Fell.

- Cherrie Katashi.

A maior parte da aula foi assim. Na verdade, eu quase não percebi que os sinos já estavam batendo.

- Hey, o livro. Pagina 23 tem um texto sobre feitiços de proteção, quero um resumo escrito a mão. É, é. Sou uma pessoa terrível que acha que vocês não têm vida pessoal mesmo, e é para a próxima aula!... Ah, tchau Gabs, Cherrie. – A última parte foi dita enquanto passávamos ao seu lado, em caminho a porta.

Quase jurei para mim mesma que iria socar o próximo que me chamasse de “Gabs” me soava quase tão idiota quanto “Gabi”. Já disse que odeio apelidos, não?

O resto da tarde foi um tédio. Aulas, aulas e aulas.

E bem, não vi Benjamin em lugar algum, há. Evitando-me de novo? Mas quem se importa.

Eu não. Não mesmo. Nem um pouquinho. Nada. E não discuta comigo.

Eu voltei sozinha para o dormitório, Brige foi para a sua torre seu e Cherrie foi encontrar Miguel.

- Ah oi. – Anastácia murmurou para mim, enquanto mexia no seu notebook e Abgail lia “O morro dos ventos uivantes” – Gabriela, você recebeu uma carta. – Ela apontou com a cabeça para a minha cama.

Eu logo reconheci a caligrafia arredondada de minha mãe no envelope que eu rasguei.

Gabriela,

Como vai querida? Eu pensei ter sido clara quando disse que acabaria com você se não me escrevesse. Quer matar sua pobre mãe do coração?

Tem tido melhoras no seu humor com a escola? Fez novas amizades? E quanto as aulas? E os garotos, conheceu algum?

Eu tenho certeza de que o Instituto será maravilhoso! E por favor, se empenhe nisso Gabriela, deixe sua mãe feliz de saber que não tem uma filha totalmente revoltada com o mundo, eu só quero ver você sorrir de verdade, como nos velhos tempos...

Me mande noticias, urgentemente. E nada de e-mails, não me entendo com essa tecnologia traiçoeira, você sabe.

Cuide-se querida.

Com carinho, mamãe.

Eu ri da carta. Tão típico de Andrea Alcântara!

Peguei um pedaço de papel e comecei.

Mamãe, sem toda sua histeria, por favor. Vamos nos ver no final de semana.

Está tudo ótimo, e hey, acho que tenho duas amigas. Ou ao menos o mais próximo disso desde os meus onze anos de idade. Feliz agora?

E tudo bem, admito que a escola não é tão ruim assim, na verdade é divertido. – O que? Não custava nada alterar um pouco a realidade para minha mãe ficar feliz. – Mas ainda sim, mal posso esperar pelo fim de semana. Prometo que responderei seu interrogatório com todos os detalhes que você quer. – Ta ta,eu não quis tocar em nomes de garotos, ainda mais os que começam com B. Mas não custava nada escrever o que minha mãe queria ler, oras!

Te amo e estou com saudades, Gabriela.

Ps. Você conhece Marek Giatti?

Enviei minha pequena carta no dia seguinte.

Eu dormi tranqüila. Sem mais pesadelos ou visões de Cherrie, ou qualquer coisa de Benjamin.

Parecia que eu estava voltando a normalidade.

domingo, 17 de outubro de 2010

Capitulo oito: Veneno

- Benjamin! – Chamei de novo. Eu sabia que ele havia ouvido da primeira vez, era impossível não ouvir já que ele era um vampiro. Então, ele estava apenas me ignorando.

O seu rosto estava com as expressões duras quando olhou para mim.

Eu parei de frente para ele. Deus, bonito parecia até uma ofensa olhando para aquele rosto. Ele era algo deslumbrante...

Acho que eu nunca vou me cansar de descrevê-lo também.

Eu perderia tempo nisso, mas toda a beleza estava indo embora. Benjamin havia se levantado e me dado as costas, simples assim.

Ou não tão simples.

- Benjamin! – Eu disparei.

- Benjamin Bertrand! – Eu agarrei seu ombro. Ele parou, mas não olhou para mim. – Eu quero falar com você, por favor.

Ele virou os olhos verdes, ainda numa mascara dura e sem emoções.

- Eu. Bem. – Respirei fundo. – Eu sinto muito.

- Sente muito? Pensei que essa frase não significasse nada para você, Gabriela.

Ok. Essa doeu.

- Eu sei que você deve estar me odiando agora. Eu sei que sou uma idiota, uma estúpida sem educação e egoísta também, e você tem todos os motivos para querer que eu suma. Mas olha... Eu estava com raiva. Eu não queria dizer tudo aquilo que disse e agora eu só quero pedir desculpas.

- Você está falando sério? – Ele arqueou uma sobrancelha espantada para mim.

- Sim. – Respondi firme. – Eu sinto muito. - Reforcei.

Ele se jogou para o lado e encostou seu corpo na parede, pensativo.

Eu me aproximei. Não queria que ele estivesse distante, não queria correr risco de ele fugir de mim.

E silêncio, segundos de silêncio que pareciam horas para mim.

- “E logo vou olhar, com que ansiedade...
“ As minhas mãos esguias, languescentes,
“Mãos de brancos dedos, uns bebés doentes
“ Que hão de morrer em plena mocidade
!” – Ele suspirou baixinho.

- E você está recitando Florbela Espanca por? – Indaguei.

- Você conhece? – Ele me fitou espantado.

- Não sou uma completa ignorante. – Dei de ombros. - “E ser-se novo é ter-se o Paraíso
“ É ter-se a estrada larga, ao sol, florida,
“Aonde tudo é luz e graça e riso!”
– Completei olhando para seus olhos verdes.

- “E os meus vinte e três anos… Sou tão novo!
“ Dizem baixinho a rir “Que linda a vida!…”
- “Responde a minha Dor: “Que linda a cova!” – Terminamos em uníssono

Ele sorriu. Eu me aliviei.

- Você não me quer na cova por fim?

- Me desculpe. – Eu não pensei no momento, apenas coloquei a minha mão no seu rosto. – Me desculpe. – Repeti enquanto olhava para os seus lhos verdes.

Ele pegou minha mão, o toque era frio e... Delicioso.

Ele agiu rápido, rodopiou nos próprios pés e enquanto eu o acompanhava com os olhos ele se aproximou, firmando os braços na parede atrás de mim agora, cada um de um lado, me prendendo sem me tocar.

Os olhos verdes fixos nos meus.

- Você não me odeia? – Dessa vez ele parecia se divertir com as palavras, talvez eu tivesse conseguido contornar sua magoa.

Ou não.

- Não, eu não odeio você. - Ele suspirou pesado, dando uma breve pausa em nosso dialogo.

- Eu queria poder passar por toda essa sua parede de rancor e conhecer a verdadeira Gabriela. – Ele falou mais para si mesmo do que para mim, mas mesmo assim eu respondi.

- Só por dizer isso, talvez você já me conheça melhor do que pensa.

Ele sorriu de novo. Sorriu de verdade.

- Acho que você pode voltar a me odiar depois disso, mas é um risco que eu preciso correr.

Ele estava mais perto agora, na verdade estava quase colado a mim. O hálito fresco e a respiração gélida batendo no meu rosto. Os dedos contornaram o desenho da minha face.

Eu demorei para perceber o que ele pretendia, e só tive a certeza quando já estava acontecendo. Benjamin estava perto de mim, grudado a mim. Os lábios movendo-se delicadamente nos meus. A mão que antes estava na parede afagava meus cabelos, e a outra prendia minha cintura.

Era como um feitiço, gélido mas que me queimava por dentro. Fogo frio.

Ele finalizou e deslizou os lábios até meus ouvidos.

-“Eu quero amar, amar perdidamente! Amar só por amar: Aqui...além....” –Sussurrou outro verso de outro poema de Florbela em meu ouvido.

- Não. – Quase gritei e o empurrei para longe. – Você não podia ter feito isso.

- Por quê?

- Porque não! Eu sou uma bruxa e você é um vampiro...

- E eu devia estar morto?

- Eu não disse isso. – Parei para olhar para o rosto dele pela primeira vez, porque agora só as minhas bochechas queimavam, de vergonha.

- Não, você disse isso. Exatamente isso. – Ele respondeu amargo. – Porque veio se desculpar se não era sincero, Gabriela?

- Mas é sincero, Benjamin eu sinto muito pelo que eu disse. Mas então você me agarrou a força e tudo ficou confuso. Tecnicamente, somos de espécies diferentes e...

- A força? – Ele arregalou os olhos para mim. - Desculpe, acho que perdi o momento em que você tentou ao menos evitar.

- Velho estúpido! – Eu xinguei sem pensar, porque ele só não me deixava terminar de falar. Era... Errado eu sou uma bruxa e ele é um vampiro. Não é natural...

- Pirralha mimada. – Ele revidou.

Ele se virou, ele ia embora... Ia fugir de mim de novo.

- Espera. – Chamei. Ele parou.

- Droga Benjamin, eu não sei o que dizer... Eu... Só é estranho, não é certo...

- Não diga nada. Você disse que não queria mais me ver ou falar comigo, você disse que me queria morto. Já foi o suficiente, não acha?

- Mas você não consegue entender...

- Não, eu não consigo. Eu juro que tentei entender você, mas a conclusão me decepcionou demais, porque as únicas respostas que eu encontrei envolviam egoísmo em excesso. Mas quer saber uma novidade Gabriela? O mundo não está girando em torno de você.

Eu precisei de alguns segundos para absorver tudo.

- Você quer dizer que...

- Eu quero dizer que eu estou cansado de tentar te entender, cansado de tentar ficar ao seu lado, e droga convivemos só a três dias? Eu quero dizer, que eu desisto, Gabriela. Ou se você quiser em termos simples, você pode ir para inferno.

UAL.

Não havia como impedir que ele fosse embora agora, não havia vontade de impedir que ele fosse embora.

Ele virou as costas e sumiu pelo corredor.

Eu cai de joelhos. Meus olhos arderam.

Não, por deus, não seja ridícula Gabriela!

Mordi o lábio tentando evitar chorar, porque eu me importava? Em meus bons tempos eu revidaria com um bom palavrão e fim da história.

Mas agora parecia que havia algo me dilacerando por dentro. Oh, quão dramático e exagerado isso. Mas era assim, porque parece que eu acabo de descobrir alguém com que eu me importe. Benjamin, o cara que havia acabado e me mandar ir para o inferno.

Então essa é a sensação de quem se importa? As palavras doem tanto assim?

Então eu estou tomando um pouco do meu próprio veneno afinal.

Balancei minha cabeça enquanto me levantava e quase corria sem direção. Queria apenas espantar todos os pensamentos. Queria não me importar mais.

Eu faria isso.

***

- Mas foi um beijinho, um beijo ou um beijão de cinema?

- Você não ouviu o final da narração, Brige? Aparte do vá para o inferno?

- Existem detalhes que fazem a diferença! – Ela deu de ombros.

- Então, o plano de reconciliação no fim foi um fiasco. – Cherrie bufou.

- O maior de todos. E doloroso também. – Completei.

- Vou parecer insensível demais se disser que a culpa é sua? – Brige resmungou entre dentes.

- Não. É a verdade, uma verdade nada amigável, mas a verdade.

- Eu também sou uma péssima amiga, se formos avaliar. – Ela fez uma careta e passou o braço pelo meu pescoço. – Mas não esquenta chuchu,a s coisas sempre dão certo no final. – Ela deu um soquinho de leve na minha cabeça. E eu ri.

Mas senti falta de outra voz entusiasmada.

- Cherrie você está bem? – Perguntei fitando Cherrie a uns três passos para trás de nós, enquanto caminhávamos no corredor.

- Desculpe Gabriela. Minha cabeça está me matando. – Ela resmungou massageando as têmporas.

- Pensei que você tivesse ido a enfermaria ver isso – A preocupação de Brige mostrou que a dor não era recente.

- Hey, Florence Casanobba pode faze ruma poção e a dor passa em dois segundos. – Completei.

- Eu já fiz isso. Eu já tomei uma poção, a dor voltou.

- Então vamos voltar para a enfermaria. – Sugeri. – Deve haver algum feitiço mais forte.

- Não, está tudo bem. Vamos para o dormitório. – Ela resmungou. – Temos de criar um plano B de reconciliação, não acha? – Ela tentou sorrir.

- Não. Não vai dar certo. Chega de Benjamin Bertrand, pelo resto da minha vida.

- Você não está falando sério. – Cherrie quase arregalou os olhos.

- “Vá para inferno” me pareceu uma frase bem clara. Aceitem, nós nos odiaremos para sempre agora. Fim da história. – Respondi amargurada.

- Mas ele te beijou. – Brige tentou parecer animada.

- E eu estraguei tudo. De novo. – e talvez fosse melhor assim, afinal. Espécies diferentes.

Brige revirou os olhos.

O único movimento presente. Cherrie estava para trás, quieta. Anormalmente quieta.

Quase simultaneamente Brige e eu nos viramos para checar.

Mas aquela garota não parecia Cherrie. Essa se parecia mais com um fantasma da Cherrie sorridente e falante, seus olhos vagos denunciavam isso.

Ela estava parada no corredor, nós a encarávamos.

- Cherrie, você está bem? – Perguntei, os olhos pareciam mortos em seu rosto.

- As vozes... – Ela murmurou.

- Cherrie o que diabos...

Sua mão direita subitamente ergue-se e me encontrou, ela estava fria o suficiente para me causar arrepios.

- Lutar. Gabriela, lutar. – Ela aumentou algumas oitavas na voz em um tom estridente.

- Cherrie o que você está sentindo? – Indaguei na esperança dela responder.

Mas ela não estava sentindo. Era muito mais forte do que os sentimentos mediúnicos que ela tinha. Era... Como uma visão?

- Morte... –Seus olhos reviram dentro das órbitas e a “boneca Cherrie” de olhos vazios caiu com um estrondo no chão.

Brige gritou.

- Gabriela, mecha-se. Precisamos levá-la para a enfermaria.

Eu logo me coloquei a correr, tentando ajudar Brige a carregar o corpo desacordado de Cherrie pelos corredores da escola.

- O que aconteceu? – A enfermeira perguntou enquanto vinha em nossa direção.

Brige contou uma história atrapalhada enquanto Florence agia.

Eu segurei a mão de Cherrie, para esperar que ela acordasse.

Florence mergulhava um pano branco em um recipiente enquanto murmurava algumas palavras que eu desconhecia. Havia um cheiro de hortelã e ferrugem no ar.

- Brige, temos que avisar Lucy.

- Eu vou. – Ela se levantou devagar e saiu.

A enfermeira pressionou fortemente o pano contra o nariz de Cherrie.

As suas pálpebras começaram a tremer. Ela afastou o tecido enquanto Cherrie acordava.

- Cherrie, o que você está sentindo? – Ela perguntou.

- Minha cabeça... O que?

- Calma. – A enfermeira colocou a mão nos ombros dela. – Há alguma dor?

- Eu estou bem. A minha cabeça estava doendo... Mas passou.

- Como passou?

- Sumiu. Eu estou bem. – Ela disse se sentando.

- Então você só queria nos matar de susto? – Falei em tom de brincadeira.

- O que eu fiz? – Ela tentou sorrir. Tentou.

- Você não se lembra?

- Não...

- Pequena! – Lucy entrou correndo pela porta. – O que aconteceu?

- Eu, eu não sei. – Cherrie respondeu confusa. - Eu estava andando com a Brige e a Gabriela, minha cabeça estava doendo. E depois eu estava aqui.

- O que aconteceu exatamente? – Reparei que Lucy não estava sozinha. Miguel falava, e ainda atrás estava Brad.

Brige narrou a breve história, até as falas e os desmaios.

- Como assim ela falou morte e caiu? O que aconteceu pequena? - Lucy reclamou de novo.

- Lucy, ela não se lembra. – Eu queria dizer isso, mas foi Miguel, o bruxo de olhos azuis quem falou. – Cherrie, concentre-se. Você pode se lembrar se quiser. É a primeira de muitas visões, você vai ter de se acostumar com isso. – Ele falou de modo te carinhosos enquanto segurava a outra mão de Cherrie. Eu estava com a esquerda nas minhas, soltei.

- Visão? – Ela perguntou.

- Comunicação com um espírito morto. Aconteceu comigo há dois anos. – Ele deu de ombros.

- Oh, você é médium querida? Miguelzinho era o único médium que eu conhecia. - A enfermeira falou quase emocionada.

Miguelzinho?

- Vó! Nós já falamos sobre essa história de Miguelzinho!

Brad caiu na gargalhada.

Miguel é médium e neto de Florence. Vivendo e aprendendo.

- Desculpe esqueci que você é metido a adulto. – Florence respondeu fingindo amargura. – Mas ainda é meu Miguelzinho!

Pensei que Brad fosse ter um ataque de tanto rir enquanto repetia para si mesmo “Miguelzinho”

Lucy olhou feio e ele ficou um pouco mais controlado. Um pouco.

- Tanto faz. – Cherrie reclamou. - Não podemos falar disso amanhã. Eu preciso dormir, vamos pro quarto. – Ela começou a se levantar.

- Hey! Vai com calma pequena. Quem disse que você vai voltar para o seu quarto hoje? – Lucy a segurou pelos ombros.

- O que? Você quer que eu durma na enfermaria? – Cherrie respondeu irônica.

- Se for preciso.

- Lucy! Eu estou bem. Vou ter de repetir quantas vezes pra vocês? Perfeitamente bem. – Ela respondeu mal humorada.

- Florence! – A irmã mais velha pediu por ajuda.

- Ela vai ficar bem Lucy, de tempo. Esse foi a primeira visão. – Foi Miguel quem respondeu.

- O que? Então eu vou desmaiar toda vez que ver alguma coisa?

- Não, você vai se acostumar. Acredite. –A pergunta foi de Lucy, mas ele respondeu para Cherrie. - As primeiras são as piores, mas você aprende a lidar com isso. Posso ajudar você, se quiser.

- Eu quero.

- Acho que você pode ir para o seu quarto, então. – Florence interrompeu.

- Ótimo! – A Cherrie sorridente voltou.

Eu e Brige a acompanhamos enquanto Lucy fazia um interrogatório aos dois Casanobba e Brad voltava a suas piadas com “Miguelzinho”.

- O que você acha que queria dizer? O espírito. – Brige perguntou.

- Eu não sei. O que eu disse?

- Chamou o nome da Gabriela, disse lutar e morte.

- Meu nome? Fazia parte da visão? – Me dei conta, quer dizer, eu não havia tido tempo de me concentrar na visão em si.

- Eu não me lembro dele, isso deve significar sim.

- Mas o que diabos significa então? – Perguntei.

- Nós vamos descobrir Gabriela, calma!

Então, esse era mais um assunto pendente. Pensei enquanto caminhávamos para o quarto.

Definitivamente. Um longo ano.

domingo, 10 de outubro de 2010

Capitulo sete: Guerreiros são guerreiros.

- Espera, você disse isso mesmo? Com todas as letras? “Você devia morrer”? – Cherrie indagou espantada.

- Essas e mais algumas. – Murmurei.

- Qual é o seu problema, Gabriela? – Dessa vez foi sotaque britânico de Brige que eu ouvi.

- Eu só estava com muita raiva tá legal? E no fim das contas foi culpa dele. – Resmunguei enquanto lamentava fortemente ter me levantado da cama cedo. Ora, como se já não bastasse o sono e o cansaço excessivo, Brige havia encontrado o diário que havia ficado bem a mostra em cima da minha cama enquanto eu me mantinha embaixo da água fria do chuveiro. Um erro reparado assim que havíamos saído do quarto. O diário estava por baixo do colchão da minha cama.

E agora, enquanto tomávamos café da manhã na nossa mesa, Cherrie e Brige, unidas pela má fé ma faziam contar a história.

- Claro que a culpa foi dele, assim como a vaca come a grama. Ela é tão insensível assassinando o pobre matinho.

- Você não é engraçada Brige! – Retruquei.

- Não estava tentando ser engraçada. Estou tentando dizer que você é uma idiota me termos educados. – Ela deu de ombros.

- Grandes amigas vocês são. - Tudo bem, eu só conhecia Cherrie a três dias e Brige a dois, mas eu não encontrava melhor palavra para defini-las.

Talvez fosse a falta de experiência na questão amizade...

- Mas você deveria no mínimo pedir desculpas, Gabriela. – Cherrie também não estava do meu lado, é claro.

- Não sei se você percebeu, mas Benjamin Bertrand não está em lugar nenhum desse refeitório. – Bem, sim eu havia percebido a ausência de Benjamin assim que coloquei meus pés no salão. Mas a escola é grande, portando este não era um bom argumento de Brige.

Mas claro que o instituto também era grande o suficiente para Benjamin me evitar, talvez pelo resto do ano.

Estremeci com pensamento.

Tudo bem. Elas estavam certas. Não deveria ter dito aquilo. Mas às vezes eu simplesmente explodo e sai gritando coisas estúpidas e sem sentido. E ele estava lá, dizendo que estava com a minha avó quando ela morreu. Que ela voltou pra salvar um vampiro idiota que não conseguiu fugir sozinho.

Deus, eu não sei nem o que pensar.

E olha que eu sempre julguei essas histórias de confusões sentimentais as mais bregas, e dessa vez eu absolutamente não consigo coordenar meus pensamentos para que eles tivessem algum tipo de coerência. Por um lado eu odiava minha avó por ter voltado e morrido. Por outro eu a admirava como uma grande heroína. Eu odiava Benjamin por ter ficado para trás e me odiava por ferir Benjamin.

Oh céus, e eu ainda tenho duas aulas de línguas humanas agora.

- Definitivamente, eu não suporto a minha turma! – Brige recobrou minha atenção. Juro que não sei qual foi o momento em que ela e Cherrie mudaram de assunto, mas haviam feito. – São todos uns bobocas. – Ela falou como se boboca fosse a maior ofensa do mundo.

Brige era desastrada e não conseguia dominar as suas mutações. O que é muito estranho para um metamorfo. Também era desorganizada, descoordenada e um tanto estranha. E uma das melhores pessoas que eu conheci na vida. Os seus olhos esverdeados eram gentis e o cabelo vermelho vibrante parecia que ressaltava sua personalidade brincalhona. Ela e Cherrie eram bem o tipo de garotas legais e cheia de amigos.

Que diabos elas estavam fazendo andando comigo?

- Ao menos vocês estão juntas na mesma turma bruxa. Sabe quem é da minha turma? Jazz Sommers.

- Pela samba canção azul de Merlin! Coitada de você, Brige!

- Quem é Jazz Sommers?

- Gabriela querida, toda escola tem uma vadia. – Cherrie sorriu.

Os sinos começaram a tocar.

Os dois primeiros tempos seriam de línguas humanas, a única matéria que eu esperava que pudesse tirar aquele assunto da minha mente.

Sou fluente em português, obvio, Inglês e meu espanhol é muito bom também. No mundo humano costumava passar meu tempo estudando línguas, quando se é uma bruxa perdida e sem amigos você acaba tendo muito tempo livre. Eu estava começando Italiano antes de vir para cá.

Brige praguejava baixinho enquanto tinha de se separar de nós para ir para sua aula. Transmutação, eu acho. Pobre Brige.

E para minha infelicidade, a professora Lexi Konisberg dedicou sua aula ao inglês básico. Que garanto que todos lá sabiam falar.

Minha cabeça voltou par aquele assunto.

Ótimo, o lado emocional e sem razão alguma venceu. Vou pedir desculpas a Benjamin.

Ao menos essa será a intenção.

E eu realmente não devia ter saído da cama hoje, droga.

-Gabriela. – Cherrie cutucou minhas costas e eu me dei conta de que a aula havia acabado.

Eu poderia narrar em detalhes tudo o que se aconteceu durante as aulas e o almoço.

Mas só uma informação é importante.

Benjamin não estava nos corredores. Ou no salão de almoço. Ou em lugar algum.

Então ele realmente estava me evitando. Ótimo.

Ou ao menos estava. Até a última aula, preparação corporal. Algo extremamente inútil, criaturas mágicas não saem brigando por ai como nos filmes e eu já havia sofrido demais na educação física da escola humana par agüentar mais quatro anos, no meio de outras espécies de outras turmas, mais velhas ou não.

O lado bom, é que assim que saímos para os gramados, vestindo os uniformes de ginástica, uma rajada de cabelos vermelhos apareceu correndo do nada e pulou em mim e em Cherrie .

- Vocês! Ah Merlin ouviu minhas preces! – Brige exclamou animada.

Outra coisa chamou minha atenção enquanto Brige e Cherrie comemoravam a união nas aulas. Ele estava lá, sozinho perto de uma árvore. Os olhos verdes sustentaram os meus olhos castanhos por um momento e então eles se desviaram.

Mas Benjamin Bertrand estava lá. Benjamin Bertrand está aqui, havia outra coisa a qual dar atenção?

-Ok, crianças. Atenção! – Parecia que o professor discordava de mim.

Havia três professores. Uma mulher, ou melhor, uma fada. Alta, esguia, de cabelos dourados e olhos escarlates. O outro era um vampiro alto, musculoso de cabelos bem penteados caindo até os ombros e olhos castanhos. O terceiro era um bruxo, foi o que havia falado. Era todo sorriso, seus olhos eram claros e felizes e seu rosto de traços angulosos e o cabelo castanho claro era curto. Não devia ser muito jovem, mas se fosse humano seria o tipo de quarentão gostoso

Que foi? Só estou colocando em termos simples...

E o rosto dele não me era estranho...

- Marek, por favor! Não assuste os alunos. – A fada sorriu gentilmente. - Boa noite. – Completou.

Essas eram as duas ultimas aulas. Ou seja, eram sete da noite agora. Na semana seriam quatro, ou seja de novo, eu teria mais duas horas de tortura em uma aula dupla na sexta a tarde.

- Eu sou Lory McKenzie. Professora de preparação corporal junto com Vicente Perôn. – O vampiro acenou com a cabeça.

- Nas semanas inicias, o professor Marek Giatti substituirá a professora Melany Novaes.

- Não chorem! Nós vamos passar muito tempo juntos nas aulas de técnica em duelo. – Marek completou com uma piscadela.

Marek Giatti. Oh, eu havia lido esse nome na noite anterior. Nos quadros dos corredores

Bruxo do diamante. Descobridor do fogo frio.

Mas aquele não era o Marek Giatti do quadro. Devia ser o filho, ou até mesmo o neto.

- Onde está à professora Melany? – Alguém no meio alguma das turmas perguntou.

- Ela está de férias. – Lory, a encantadora fada Lory, deixou um reflexo sombrio passar por seus olhos enquanto respondia.

Cherrie se agitou do meu lado. Eu perguntaria a ela mais tarde.

Por hora, eu já tinha uma preocupação. O professor Marek rodava uma bola na ponta do dedo.

- Que tal começar por algo simples? – Ele sorriu. Tinha um ar mais de adolescente do que de professor. – Futebol.

Futebol. Confesso que fiquei um pouco animada. Qual é, sou brasileira. Adoro futebol! O detalhe é que eu apenas gosto de assistir e torcer. Jogar não é bem meu forte, gritar com a televisão como uma louca é bem mais divertido.

Cada professor saiu com um grupo de alunos, antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa, Benjamin havia sumido com o professor Vicente.

Marek materializou a marcação do gramado e os gols.

- Cherrie, você percebeu também? – Perguntei quando nós três estávamos mais isoladas do times que iam se formando.

- A mentira. – Ela deu de ombros compreendendo que eu falava da professora – Eu senti. Foi difícil não sentir. O espírito dela se perturbou quando ouviu a pergunta.

- Mas porque ela mentiria sobre a professora Melany estar de férias? – Brige entrou na conversa.

- Esse é o estranho.

- Hey, garotas. Não quer que comecemos sem vocês, não é? – O professor Marek gritou.

Eu fiquei no gol. Particularmente não fui tão ruim assim. Tomei um gol de um lobisomem idiota. Que resolveu que seria legal se transformar no meio da aula. Eu nunca havia visto um lobisomem se transformando na minha frente antes. E pulou e explodiu numa forma grotesca. Um lobo que ficava em pé sob duas patas grandes e arrastavam um par braços peludos. Eles não tinham rabo e o rosto era um lobo perfeito a não ser pelos dentes, que deviam ser o dobro da quantidade do animal comum.

Quem se preocuparia em pegar uma bola assim? Eu fiquei assustada.

Mas a parte mais vergonhosa foi quando Marek Giatti confirmava os nomes dos alunos antes de irmos para o chuveiro.

- Gabriela Alcântara? - Ele riu. – Sabia que sua careta não me era estranha! Como vai? E a Andy?

- Como? – Indaguei e ele riu.

- Claro que você não se lembra de mim. Da última vez que te vi, você devia ser desde tamanho! – Ele levou a mão até o joelho. – Não que tenha crescido muito. – Ele deu um tapinha na minha cabeça e eu fiquei sem reação por algum minutos.

Eu ouvi a risada abafada de Cherrie e Brige, que graças a Deus, eram as únicas perto o e interessadas o suficiente para ouvir.

- Mas, Gabizinha, finalmente você envelheceu então! Por Merlin, eu devo estar velho mesmo. Ainda ontem eu estava aqui com Andy e Arienne.

- Espera, você está falando sobre...

- De Arienne Alcantara, claro. Grande bruxa. Ela dava aulas aqui quando comecei, é uma pena que não tenhamos convivido muito tempo. – Ele suspirou.

Oh céus, todos aqui estavam decididos a me contar histórias sobre a minha avó.

- Mas e a Andy, como está? – Ele recomeçou a conversa.

- Quem?

- Andy, garota! A sua mãe! – Ele ergueu a sobrancelhas me olhando como se eu fosse idiota.

- Você quis dizer Andrea, não? Ela está muito bem. Obrigada. – Respondi seca.

- Ah, eu não vejo Andy a tanto tempo! – Ele bufou, insistindo no Andy. Isso me enraiveceu a certo ponto. Minha avó costumava chamar minha mãe assim.

- E você é amigo da minha família desde quando? – Carreguei minha voz de armagura.

- Ora, guerreiros são guerreiros Gabriela! – Ele deu uma piscadela sem se abalar com meus esforços para ser mal-educada.

Guerreiros são guerreiros. Repeti mentalmente tentando encontrar o sentido da frase.

Eu só encontrei um, e não quis me abalar novamente. Meu deus, esse lugar estava cheio de sobreviventes! Como se eu já tivesse problemas demais para resolver com um em especial.

Depois de pedidos para mandar lembranças a “Andy” de Marek, que eu descobri ser Marek Giatti Terceiro um tagarela de primeira, fomos para o chuveiro do banheiro principal. Embora eu preferisse ir para o particular do quarto, eu ainda tinha um plano de falar com Benjamin.

Mas eu estava suada e fedendo a grama depois do jogo. Precisava de um banho.

E de uma desculpa para criar coragem também.

Portando demorei um pouco mais que o necessário para me lavar e colocar meus jeans.

Só que eu não podia adiar para sempre. Benjamin podia sumir novamente.

Sai do banheiro.

- Tenho uma boa noticia para você. Seu plano de nos enrolar falhou. – Cherrie riu me esperando na porta ao lado de Brige.

- Benjamin está a um corredor de distancia. E sozinho, perto dos jardins. – Brige sorriu maliciosa.

Eu bufei e revirei os olhos para elas.

- Tudo bem. Eu vou falar com ele. –Ambas me olharam feio. – Vou pedir desculpas ele. Que seja.

Passei por elas, mesmo que cada um dos meus passos pesasse demais para me levar ao fim do corredor, eu continuava seguindo em frente. Nunca fui boa com desculpas. E que diabos eu deveria dizer? “Hey Ben, desculpe por dizer que você é um assassino” ou talvez “ Oi Benjamin, como vai. A propósito. Acho que alguém vai sentir sua falta quando você morrer”

Acho que não seria legal.

O corredor terminou, e havia chegado a enorme varanda dos fundos do instituto.

Agora seria ainda mais difícil de pensar. Ele estava ali. Parado, sentado no pequeno muro admirando a visão que dava para o lado das sereias.

- Benjamin. – Chamei.